Caminhos solitários

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Jovens, grávidas e idosos. Esses foram os principais grupos de atenção que a Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu como foco de sua campanha chamada “Depressão: vamos conversar” lançada em 2015 diante do elevado crescimento do distúrbio entre a população mundial. Números daquele ano dão conta de que existem mais de 300 milhões de pessoas depressivas no mundo, tornando a doença o principal motivo de incapacidade física e mental de todos os tempos.
A prevalência da depressão entre os jovens nunca foi tão elevada como agora e já é a segunda causa de suicídio entre eles, perdendo somente para as mortes em acidentes ou outras formas violentas. No caso das grávidas ou mães recentes, o percentual chega a 15% que vão sofrer ao menos o blues (quadro leve de alteração do humor logo após o nascimento do bebê). E os idosos, devido principalmente ao isolamento de suas comunidades, ficam mais frágeis e sujeitos aos transtornos depressivos.
Por isso a campanha da OMS entende que conversar com alguém em quem confia (membro da família, amigo, professor, etc) pode ser o primeiro passo no sentido de obter ajuda especializada para tratar adequadamente as causas, minimizando sensivelmente as dolorosas consequências.

Cenário brasileiro
O Brasil está no topo dos países com alto índice de depressivos. Pesquisas apontam que a doença já atinge mais de 11 milhões de pessoas, sendo o maior em toda a América Latina e o segundo nas Américas. Perdemos somente para os Estados Unidos.
De acordo com um estudo realizado pela Unifesp em 2013, estudo esse de alcance nacional, 15% da população amostrada possuía depressão severa, número muito superior aos números apresentados em estudos anteriores, os quais apontavam um percentual de prevalência não maior do que 10%.
A pesquisa aponta dados interessantes dessa prevalência sobre as diversas características da população. A pessoa candidata com maior propensão a ter a doença geralmente é mais velha, possui menos escolarização, é divorciada, separada ou viúva, mora na região norte do Brasil, e possui pior condição financeira. Além disso, mulheres têm quase o dobro de incidência da doença quando comparadas aos homens.
Assim sendo, em um cenário extremo, uma mulher viúva, sem filhos, amigos ou vizinhos, vivendo isoladamente em uma região pobre no norte do país teria uma propensão muito maior do que outra mulher vivendo em um círculo social ativo, mais estudos e com maior expectativa de melhoria de vida.

Eletricidade mitigadora
Pesquisadores do Hospital Universitário da USP iniciaram em 2013 uma série de experimentos com pacientes depressivos utilizando a eletricidade como fator atenuante dos sintomas da doença. Em síntese, o processo necessita de um equipamento simples composto por um estimulador elétrico transcraniano de corrente contínua (pequena caixa do tamanho de um notebook) de onde saem dois fios cujas pontas possuem um eletrodo cada, os quais são afixados nas têmporas do paciente.
Uma vez ligado, o estimulador emite uma corrente elétrica de baixa intensidade que atravessa o córtex durante 20 a 30 minutos, de tal forma a restabelecer o funcionamento normal dos neurônios. Em comparação aos métodos medicamentosos usuais, que podem provocar taquicardia ou perda do interesse sexual, o tratamento com o estimulador elétrico apresenta efeitos colaterais amenos que se resumem a um formigamento durante as sessões e a uma vermelhidão na região em que são colocados os eletrodos.
Embora os experimentos iniciais indiquem um caminho alternativo ou no mínimo complementar aos tratamentos convencionais para a depressão, estudos mais abrangentes ainda precisam ser empreendidos. Enquanto isso acontece, é preciso estar atento aos mínimos sintomas do distúrbio. Manter hábitos esportivos, levar uma vida social minimamente ativa, elevar expectativas de melhora de vida e procurar ajuda especializada são recomendações que a Organização Mundial da Saúde define como prioritárias para minimizarem uma tendência mundial ao caminho solitário de uma sociedade depressiva.

Publicado na edição nº 10172, de 31 de agosto e 1º de setembro de 2017.